quinta-feira, 13 de setembro de 2012

O PASSADO, O PRESENTE, O FUTURO

PONTO PRÉVIO

Portugal atingiu no final de 2010 um estado calamitoso. O estado português estava na falência, sem dinheiro para fazer face aos seus compromissos, entre os quais, pagamentos de salários a todos os funcionários públicos. O governo de então endividava-se desesperadamente e continuava a gastar de forma desmesurada. Não havia rigor fiscal e, Portugal, no seu todo, estava desajustado na sua relação entre consumo e investimento face à produtividade que conseguia. Em suma, gastava-se mais (e mal) do que aquilo que se tinha.

O FACTO

Com o processo eleitoral desencadeado (fruto do não acordo do PEC IV) houve necessidade de recorrer a ajuda externa para injecção de capital nos cofres do estado português.
Surge a chamada Troika e a sua intervenção em Portugal. De uma forma simplista, esta terceira ajuda do Fundo Monetário Internacional ao estado português, resume-se a um empréstimo de milhões, em várias tranches, segundo regras específicas, que foram acordadas entre os principais partidos portugueses (PSD, PS e CDS-PP). Foi um compromisso de estado, em nome de Portugal, onde se aceitou ajuda financeira em troca de cumprir determinados objectivos (as tais regras) económicos, financeiros, sociais, administrativos. Foi um compromisso para reformar o estado português, o seu funcionamento e a sua relação com os cidadãos. 

O 1º ANO


Em 2011 entrou em funções um novo governo. Esse governo, fosse ele qual fosse, já tinha o seu programa condicionado. Era sua obrigação, em nome do compromisso assumido pelo estado português, aplicar, respeitar e desenvolver as medidas da Troika. Não havia volta a dar.

Dessa forma, o primeiro ano deste governo não foi de governação, mas sim de gestão e aplicação das medidas acordadas com a Troika. Era necessário uma reabilitação financeira do estado. Era necessário não falhar para poder haver novas transferências financeiras para os cofres do estado. As chamadas medidas de austeridade eram impreteríveis e compreensíveis.


O PRESENTE

O problema do estado português está longe de estar resolvido. Ainda mais longe, está o estado dos portugueses e do próprio país. É aqui que se esperava a acção governativa. Sabe-se que não se pode abrandar nos sacrifícios de todos, sob pena de voltarmos atrás. É necessário ajustar o país à sua realidade, à sua capacidade produtiva, à sua dimensão, ao seu lugar na Europa. Não podemos voltar ao passado e gastar como nórdicos e ganhar e produzir como os países em vias de desenvolvimento.

E até aqui, com mais ou menos protestos, havia um consenso generalizado sobre esta necessidade. Havia uma aceitação política dos factos.

Mas com os anúncios recentes de algumas medidas para o orçamento de estado de 2013 parece que tudo está a ruir.
Mesmo com o desvio orçamental e o não cumprimento na íntegra das metas (por ex.º do défice) estabelecidas para 2012, o governo teria de (agora sim) de governar e ter sensibilidade e habilidade política para diversificar as medidas a aplicar. E não foi isso que fez. Optou por uma espécie de suicídio político e num divórcio litigioso com os portugueses.


A opção em reequilibrar as contas do estado apenas pela via da receita é um erro. É verdade que já houve muitos cortes na despesa mas que, maioritariamente, apenas incidiram sobre os rendimentos de trabalho dos funcionários públicos. Agora, era necessário um sinal de maturidade política e sentido de estado. Um sinal de mudança na forma de governar Portugal. O governo tinha que equilibrar os sacrifícios entre as receitas e as despesas. Tinha de ter tido a coragem de reformar alguns sectores do estado e cortar a enormíssima e (em muitos casos) supérflua despesa do estado.

Em dois anos houve tempo para iniciar e aplicar algumas (reconheço que todas não é possível) reformas fundamentais, como sejam: a reforma administrativa do território e consequente redução dos municípios; a renegociação dos acordos (alguns ruinosos) estabelecidos nas parcerias público-privadas (PPP); o reajustamento de salários e regalias dos gestores públicos e uma reforma profunda nas empresas públicas; uma limpeza às reformas fictícias (os que já estão mortos e recebem, os que recebem em duplicado e em triplicado, etc); uma maior eficácia fiscal, nomeadamente, no combate à fuga fiscal, seja do trabalhador por conta de outrem, seja da grande entidade bancária; no combate à subsídio-dependência existente em todos os sectores da nossa sociedade, seja através do RSI ou das Fundações, por muito respeitadas que sejam; nos privilégios excessivos que a classe política usufrui; nas rendas do sector energético; etc, etc, etc.
Sem esse equilíbrio e sinal de boa fé por parte do governo, as pessoas não compreendem e não aceitam o que lhes é imposto. 


O FUTURO


A contestação social aumentou de forma exponencial e alargou-se a todos os sectores da sociedade. Há um reconhecimento geral (e não generalizado) de que não podemos continuar apenas por uma via. É necessário mudar o tráfego da austeridade para outras vias.

Alguns (os mais extremistas) defendem a queda do governo. Nesta altura seria um suicídio colectivo. Não é esse o caminho.

Mas o governo tem de ser capaz de assumir o erro. Tem de ser humilde e reformular o orçamento de estado para 2013. Tem de ser corajoso e retirar algumas medidas que visam a receita, implementando outras que diminuam a despesa. Tem de ser hábil e não colocar em causa decisões do Tribunal Constitucional ou mascará-las com questões de semântica. Tem de ser politicamente inteligente e voltar atrás um passo, para poder dar dois para a frente. Tem de respeitar, compreender e saber interpretar todas as críticas que têm sido feitas a estas medidas, por todos os quadrantes da sociedade. Tem de reajustar as medidas à realidade (agora sufocante) do país. Quando as opiniões, da esquerda à direita política, do trabalhador ao grande empresário, do sindicato à confederação patronal, do reformado ao desempregado, do gestor público ao banqueiro, começam a coincidir em muitos pontos, é porque algo está errado.
Hoje o desafio do governo é reconhecer o erro e equilibrar as medidas a implementar a Portugal e aos portugueses, porque elas são necessárias para o futuro deste país. Não é voltar atrás; é repensar a estratégia.
Tenho esperança que a democracia funcione e, se necessário e em última instância, que os deputados do arco maioritário chumbem o orçamento de estado. Não deve o parlamento ou o governo esperar pelos vetos presidenciais ou declarações de inconstitucionalidade.
Tenho esperança que o governo seja sóbrio e lúcido. Em nome de Portugal, em prol dos portugueses.

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