segunda-feira, 16 de julho de 2012

A LICENCIATURA


«Nem tudo o que é lícito é honesto

Este princípio do antigo direito romano poderia resumir todo o caso da polémica licenciatura de Miguel Relvas. 
A frase transmite a necessidade de reconhecer a diferença entre o direito e a moral. 
O direito impõe as regras através de códigos e leis e a sujeição a essas regras impostas pelo poder público. 
A moral é determinada pela consciência da sociedade que nos rodeia e a sua aplicação é autónoma para cada individuo; é imposta pela consciência de cada um.

E aqui começa a controvérsia em redor da licenciatura do ministro Miguel Relvas.

Em primeiro lugar, o campo legal. 

Pelo que pude constatar nos meios de comunicação social, o chamado acordo de Bolonha permite que a experiência profissional, académica ou civil de uma pessoa possa conferir determinada equivalência a disciplinas (créditos ou unidades de crédito) de uma determinada licenciatura, mestrado ou doutoramento, desde que devidamente avaliada e comprovada a sua relevância para esse grau de equiparação.  Se analisarmos apenas esta vertente, Miguel Relvas utilizou uma estratégia, que leigamente vou designar como: “Do não, não passa”. Ou seja, arriscou.

O problema foi a entidade e os indivíduos que analisaram esse seu pedido. Pergunto-me como é possível, com uma experiência quase exclusiva em funções políticas partidárias (nem sequer foram de governação), com umas fugazes passagens pelo ensino superior e ainda mais efémera passagem pela vida empresarial,  sem qualquer trabalho de investigação ou de nível académico reconhecido pela sociedade, reconhecer mérito e relevância para uma equivalência de quase 90 porcento de uma licenciatura ? Será que todos os profissionais deste país teriam o mesmo critério de avaliação? 

A permissividade reinou nesta equivalência. Não houve moral, mesmo agindo dentro do direito. Para os que assim atuaram deve pedir-se agora a avaliação dos seus actos e julgar em conformidade: moral e judicialmente.
Creio que o espírito inerente à abertura que o tratado de Bolonha permitiu para este tipo de equivalências, não tivesse sido propriamente aquele que foi aplicado neste caso.

Em segundo lugar, o campo moral e ético.

Face às primeiras notícias sobre o caso e, não tendo havido nenhum desmentido, Miguel Relvas, Fernando Santos Neves e os outros implicados deveriam ter rapidamente reagido de forma célere e transparente. Ética e moralmente é o que se pede a um ministro de um governo de uma nação. É o que se pede a quem tem o poder de conferir e validar um grau de licenciatura num sistema de ensino de um país democrático.
As constantes fugas para a frente, os não comentários, as respostas evasivas apenas adensaram e confirmaram os contornos dúbios de todo o processo da licenciatura do ministro em causa. O currículo académico de qualquer aluno (do ensino privado ou público) deste país deveria ser de rápida consulta e de total transparência. Não só por este caso (ou o do ex-primeiro-ministro) mas por uma questão de credibilização e transparência de todo o sistema de ensino. Ou será que existem muitos esqueletos nos armários das faculdades do tempo do pós 25 de Abril? Esqueletos que hoje têm poder decisório em diversas áreas da nossa sociedade?
Moral e eticamente, Miguel Relvas deveria ter assumido todo o protagonismo do caso e não se escudar na legalidade processual do mesmo. Ele é um ministro, não é o Sr. Relvas que trabalha na companhia de seguros XPTO.


Em terceiro lugar, a questão política.

Que este governo seria o mais contestado dos últimos 30 anos não era novidade para quase ninguém. E, já que é licenciado em Ciência Política, Miguel Relvas deveria ter consciência desse facto. Qualquer politólogo que frequentou as aulas de todas as cadeiras do curso, saberia isso.
O elenco governativo apresentado ao país em Junho de 2011 até parecia à prova de escândalos; independentes, poucos ex-governantes, caras novas.

Mas Miguel Relvas teve o condão, fruto, quem sabe, da sua vasta e longa experiência politica, conseguir, em menos de um ano, ser falado pelos piores motivos: ligações duvidosas ao caso das secretas e da Ongoing e a Jorge Silva Carvalho e as alegadas pressões a jornalista(s) do Público, caso de término estranho, quer da parte da ERC, quer do próprio jornal.
E como isso não bastava, foi a vez da licenciatura. Com o ainda fresco na memória, caso Sócrates - licenciatura ao domingo -, Miguel Relvas, o político e o politólogo, deveria ter percebido o quão está a ser nocivo para um governo que em nada tem a vida facilitada. Todas as brechas abertas na credibilidade e na moral deste governo, terão sempre como consequência as mesmas vítimas de sempre: a população, os portugueses. É o efeito borboleta.

Face a anteriores declarações de Miguel Relvas sobre o caso Sócrates, face às outras polémicas que envolveram o ministro Miguel Relvas, face à contestação generalizada da sociedade portuguesa ao governo e às suas políticas (com as quais até concordo, na sua maioria), Miguel Relvas, o ministro, teria que ter a moral e a inteligência política para ele próprio apaziguar as chamas, mesmo que isso implicasse o seu pedido de demissão; 
Para bem da moral dos políticos face à sociedade, para bem da estabilidade governativa face aos portugueses. Sun Tzu, em «A Arte da Guerra», leitura “obrigatória” para qualquer politólogo, disse: “A virtude é aquilo que leva o povo a estar em harmonia com o seu governante”. E no momento que o país atravessa, harmonia precisa-se: A bem de Portugal.

Em quarto lugar, a questão socio e psicológica.

É sabido que Portugal prima pela vaidade. É um facto inerente aos povos latinos. No caso de Miguel Relvas, não o conhecendo pessoalmente e correndo o risco de ser injusto, faço a minha avaliação pela postura, discurso e atitude que acompanho há muito, bem antes de ser ministro. Miguel Relvas exala vaidade e ambição desmedida por todos os poros que respira.

Acredito que tenha sido um incómodo para o deputado Miguel Relvas ou para o dirigente do PSD Miguel Relvas não ter título académico pelo qual pudesse ser tratado quando em contacto com outras pessoas.  Acredito que até pudesse ter causado alguns embaraços a terceiros esta falta de título académico, quando queriam dirigir-se a Miguel Relvas. O Dr., Engº ou o Arqº tornaram-se muletas no trato social, profissional e institucional em Portugal. Até as instituições bancárias insistem em colocar nos cartões bancários o grau académico, como forma pura de bajulação comercial, o que poucos recusam, na esperança que isso confira aos portadores dos cartões uma maior autoridade moral, vá-se lá saber porquê. É o país dos doutores e engenheiros que, curiosamente, não consegue albergar nem criar condições para que quase todos tenham profissões condizentes com o tal prefixo no cartão de crédito.

Em suma, Miguel Relvas padeceu do mesmo desconforto socio e psicológico que a maioria dos portugueses; a falta de confiança sem a muleta do prefixo académico que também preenche o ego vaidoso do português.



Uma licenciatura ou outro grau de ensino superior é algo que, em consciência, se pretende atingir visando uma aquisição ou aprofundamento de novos conhecimentos. A valorização pessoal pelo conhecimento. Mas esse objectivo só se cumpre com a frequência integral das aulas, com a leitura dos manuais, ouvindo aqueles que foram designados para nos ensinar, trocando experiências com outros colegas, escrevendo ensaios ou súmulas sobre livros de referência, estudando e aprendendo a ter uma capacidade crítica e de análise sobre as matérias que nos são leccionadas. 
Não consigo enquadrar Miguel Relvas neste perfil, pelo que me é difícil entender, em racionalidade lógica, todo o processo que envolve a sua licenciatura.

Em tempos de austeridade financeira, que reconheço ser necessária (pelo menos, em parte), Portugal, os seus governantes, os seus magistrados, os seus políticos, os seus professores, os seus dirigentes e gestores públicos, aqueles que detém qualquer tipo de poder decisório na vida de todos nós, a população em geral, deveria adoptar medidas bem severas de austeridade moral e ética. Só dessa forma poderia haver harmonia entre o povo o os que o governam.





quinta-feira, 5 de julho de 2012

A NATALIDADE, A EDUCAÇÃO

Vários órgãos de comunicação social noticiaram hoje que Portugal está com a mais baixa taxa de natalidade desde o início do século XX.
Quase sem excepção, todos optaram pela abordagem das causas que levaram a esta realidade.

Eu aconselharia os responsáveis deste país a olharem para esta notícia de forma diferente; a pensarem nas consequências que irão existir dentro de cinco, seis anos, nomeadamente, no sector do ensino.

Com isto quero dizer o seguinte: basta um simples raciocínio matemático para se perceber que dentro dos tais cinco, seis anos e, com continuação nos consequentes 10 a 12 anos, o número de alunos irá reduzir substancialmente. Logo, se existirem menos alunos, terão de existir menos professores e, quiçá, menos escolas.

Esta minha forma de abordar a questão da natalidade (que não me parece estapafúrdia de todo) neste campo específico da educação, poderá ser um alerta para se ponderar muito bem toda a política de eventuais contratações de docentes, de investimentos em novos equipamentos escolares (que não visem a substituição de existentes) e até de opção individual para quem pensa seguir a carreira docente.

Se houver uma nova abordagem às realidades, que contemplem planeamento e objectividade, poder-se-á evitar no futuro as habituais cenas de despedimentos forçados, encerramentos bruscos de escolas e os normais problemas políticos, económicos e sociais que estas decisões acarretam. 

Seria bom que em Portugal pudéssemos ver o poder decisório e executivo, projectar o futuro, baseado na realidade de hoje, de forma objectiva e ponderada de forma a que agisse por antecipação em vez das usuais e grosseiras reacções por necessidade e incúria. 

Eu vou sonhando...

quarta-feira, 4 de julho de 2012

A BEM DA «RES PUBLICA»


Ser ministro da res publica, (coisa pública) não implica a perda da privacidade individual de cada um.

Mas ser ministro da res publica implica seriedade, coerência, responsabilidade e responsabilização, quer pelos atos de governação, quer por eventuais atos individuais que possam colocar a credibilidade do cargo que se desempenha.

No caso da licenciatura de Miguel Relvas não se pretende uma crucificação pública, mas sim o apuramento da verdade e o assumir dos custos políticos que daí advenham.

É também necessária uma mudança de mentalidade por terras lusas e perceber que qualquer governante, parlamentar ou titular de cargo público decisório deve tornar público ou facultar, de forma transparente e sem pejo, todas as informações que sejam de interesse público sobre a sua vida

Mais uma vez, no caso Miguel Relvas, uma licenciatura "tirada" num ano, é um facto muito pouco ou nada vulgar (ou deveria ser). Como tal, e tratando-se do título académico e currículo de um ministro, deve ser visto como de interesse público.

Para os mais esquecidos, observe-se o exemplo do ex-ministro Nuno Morais Sarmento, que de forma transparente e sem pejo revelou o seu passado de dependência e consumo de drogas duras. E isso não se afigurava de tanto interesse público como a formação académica agora posta em causa.

Já começa a ser banal os nossos governantes adulterarem ou esconderem "esqueletos no armário" sobre as suas formações académicas.

Noutras paragens (civilizadas) dá direito à morte política sem passar por lugares executivos em empresas públicas ou com ligações ao estado. Por cá, continua a reinar o regabofe da impunidade política e, em alguns casos, judicial.

Em Portugal urge um Baltasar Garzón, um Paolo Borsellino ou um Giovanni Falcone... a bem da res publica.