Os portugueses já votaram e os resultados já são conhecidos. Durante estes dias, antes dos comentários e “apostas” sobre o novo elenco governativo, empolam-se vitórias, atenuam-se derrotas, justifica-se o injustificável, deturpam-se números, enfim, o habitual.
Entre dirigentes partidários, jornalistas, comentadores ou cidadãos anónimos, muito se diz e, cada um é livre de expressar a sua opinião, por muito que possamos discordar ou mesmo que seja meramente uma opinião desprovida de qualquer facto real que a suporte.
Por isso, aqui vai mais uma...
O primeiro resultado conhecido foi o da abstenção. É preocupante os níveis de abstenção que Portugal tem registado nas várias eleições ou referendos. Pior, a tendência é para um aumento de não participação no ato democrático por excelência: votar.
A justificação de que o povo não se revê nos actuais partidos políticos não pode servir de desculpa para a abstenção. A possibilidade de votar em branco é a forma democrática (uma das) de manifestar o desagrado para com os partidos, movimentos ou candidaturas apresentadas a sufrágio. Não refiro os votos nulos, pois nesses estão incluídos os votos de protesto e os que tecnicamente estão mal expressos. Os perto de 150.000 votos em branco destas eleições legislativas significam, que os descontentes com o atual cenário partidário português, são a sexta "força política portuguesa”.
Os cerca de 3.800.000 não votantes significam várias coisas:
- Que claramente existem erros de recenseamento, havendo quem aponte cerca de 1.000.000 de eleitores (mais de 10% do total de inscritos), o que é lamentável face aos meios tecnológicos existentes ou aos quase 40 anos de democracia em Portugal ;
- Que a cultura democrática em Portugal, muita das vezes e para muitos, se resume a exigir melhores estradas, maiores salários, menos impostos, mais cuidados de saúde, mais direitos, etc. Para estes, a participação na vida cívica e política resume-se a zero. Alegam que todos são corruptos, incompetentes e outras qualidades que o decoro me impede de escrever, mas também nada fazendo para mudar essa (sua) realidade;
- Que a praia (no caso deste e de outros domingos), que o desconforto da chuva, que a matiné televisiva ou o almoço prolongado na casa dos amigos é bem mais importante que escolher os seus representantes no parlamento e, consequentemente, o líder do governo do seu país. Ou seja, o bem estar individual estará sempre à frente do bem comum para estes recenseados;
- Que poderão haver alguns que discordam do sistema político vigente, sendo adeptos de outras formas de regime, como sejam o totalitarismo ou o autoritarismo, em detrimento da democracia, pelo que não querem participar na vida pública do seu país.
E finalmente, que há uma minoria que efectivamente não pôde participar no ato eleitoral, seja por motivos profissionais, de saúde, familiares ou mesmo férias fora do local de residência. Estes são os abstencionistas por razões de força maior.
Recordo que além de um direito, o voto é também um dever consagrado na lei fundamental – a Constituição da República Portuguesa. Cabe a cada um tirar as ilações que entender.
Quantos aos resultados dos partidos há claramente vencedores e vencidos.
O primeiro destaque vai para o PS e para o seu secretário-geral, José Sócrates.
O PS de José Sócrates apenas consegue cerca de 1.500.000 de votos, que lhe confere um 4º lugar no top dos piores resultados para a segunda força partidária, desde o 25 de Abril, sempre que a terceira força partidária obteve menos de 1.000.000 de votos.
(Ano – 2ª força política – número de votos)
1987 – PS – 1.260.000
(altura da primeira maioria absoluta do PSD de Cavaco Silva)
1976 – PPD – 1.350.000
1975 – PPD – 1.500.000
2011 – PS – 1.550.000
Mesmo se tivermos em conta as quatro eleições onde a terceira força partidária obteve mais de 1.000.000 de votos, o cenário desta derrota do PS de José Socrátes não melhora.
(Ano – 2ª força política – número de votos / 3ª força política – número de votos)
1985 – PS – 1.200.000 / PRD - 1.000.000
1983 – PSD – 1.550.00 / APU – 1.000.000
1980 – FRS – 1.600.000 / APU – 1.000.000
1979 – PS – 1.650.000 / APU – 1.100.000
Acresce a esta derrota inequívoca, o facto de que este PS vinha de uma governação de seis anos. Nem o PS de 1987, nem o PPD de 1975 e 1976 tinham sido governo.
Pouco mais se poderá dizer sobre a derrota do PS e de José Sócrates. Os números falam por si e representam a opinião dos portugueses.
José Sócrates também percebeu isso e demitiu-se. Nada a apontar.
Outra das forças partidárias vencidas foi o B.E..
A mensagem de Louçã esgotou-se e a falta de credibilidade das suas propostas, face à realidade, levou ao afastamento do eleitorado do B.E.. Além disso, quando Francisco Louçã chegou a deixar no ar a remota possibilidade de viabilizar um governo com o PS (em caso de vitória do PS), é certo que muitos dos eleitores voláteis que participaram na grande votação do B.E. em 2009 não viram com agrado essa hipótese; se por desilusão ou se por medo, só eles o saberão.
O certo é que o B.E. vale neste momento o que vale Francisco Louçã – cerca de 290.000 votos. Aliás, esta foi a sua votação aquando das presidenciais de 2006. Os cerca de 365.000 votos de 2005 e 560.000 de 2009 já são passado para o B.E.. Resta saber se as diversas tendências continuarão a entenderem-se. Numa agregação como o B.E. será sempre difícil haver penalizações políticas a nível interno. Louçã, defende-se como coordenador do Bloco e não como líder partidário, pelo que não se deve demitir. Também não creio que os que seguem a tendência do PSR queiram a sua demissão, sob pena de voltarem ao esquecimento total por parte do eleitorado. Será que Luís Fazenda e Miguel Portas continuarão a segurar Louçã?
Em suma, o B.E. perdeu quase metade dos seus eleitores (270.000), metade dos seus deputados e voltou a ser a quinta força partidária.
O que poderá mais perder, o tempo dirá.